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terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Manuela León


Manuela León Guamán ( nasceu em Punín , 1844 - Riobamba, 8 de janeiro de 1872 ) foi uma mulher libertária equatoriana que participou como líder na revolta dos povos indígenas. Em 2010, foi proclamada heroína pela Assembleia Nacional da República do Equador

Nasceu na comunidade de San Francisco de Macshi, hoje conhecida como Cachatón San Francisco (Hatun Kacha), filha de Hermenegildo León e María Guamán, seu nascimento foi registrado em Punín, freguesia de Riobamba, em 1844.

Corria o ano de 1871 quando as ações de um grande grupo de indígenas tentavam recuperar o que chamavam de Império Inca . Liderados por Manuela León (a rebelde) e Fernando Daquilema (o recém-proclamado rei).

Os ideais de Manuela León a levaram a liderar ações em defesa da igualdade de direitos para seu povo e a deter os abusos e a opressão que vieram do governo de Gabriel García Moreno e a enfrentar os comandantes do lado inimigo. 

Ela foi assassinada por suas ações em 8 de janeiro de 1872. Diz -se que quando perguntada pelo pelotão de fuzilamento se ela tinha algo a dizer, ela respondeu " Manapi ", que significa "nada" em sua língua. 

TRAJETÓRIA HISTÓRICA

O nome de Manuela León é sinônimo de beleza, força, coragem e rebeldia. Como mulher e como indígena, foi uma das principais lideranças do levante de Fernando Daquilema contra o governo de García Moreno e pela reivindicação de seus direitos.

Manuela aderiu ao movimento Daquilema, era o momento certo para saciar a sede de vingança pela violação sofrida pelos dizimistas de García Moreno; e liderou a tomada de Punín, em 21 de dezembro de 1871.

Com entusiasmo delirante, lágrimas de coragem, com fé, receberam a tão esperada notícia de que começaria a rebelião indígena Kacha. Manuela León, Pacífico Daquilema e sua esposa Juliana Paguay, moradores da comunidade de Pucará Pallu, tomaram a voz da revolta e exigiram o lugar de líderes das cidades de San Francisco de Macshi, Pucará, Pallu. 

Os indígenas se levantaram com tambores, churus e cornetas, convocando toda a região para lutar por justiça, porque havia chegado a hora. Manuela liderou com firmeza a mobilização contra o trabalho forçado nas estradas nacionais, impostos e delitos cotidianos.

O dia 8 de abril marca o aniversário do assassinato desta que se constituiu como uma das principais lideranças indígenas que enfrentaram a Igreja e o regime obscurantista de García Moreno, liderando o levante que começou em 18 de dezembro de 1871, em Cacha - Yaruquiés, Província do Chimborazo.

A origem da revolta

Essa revolta originou-se dos abusos na arrecadação de dízimos pelo arrecadador Rudecindo Rivera, segundo as autoridades governamentais da época e alguns comissários. Os "historiadores imparciais" dizem: "foram reunir as pessoas que tinham que pagar com seu trabalho na estrada o imposto, tão antigo quanto a República, que se chamava subsidiária".

Os povos indígenas Licto, Cicalpa e Colta aderiram ao levante promovido pelos Kachas, enfrentando as tropas do governo, após García Moreno decretar o estado de sítio em 21 de dezembro em Chimborazo, sem se intimidar com a repressão, empurrando para trás as tropas, que voltaram para Riobamba.

Como os atuais governantes, García Moreno usou qualificadores contra aqueles que se levantam contra a injustiça, na sessão do Conselho de Estado, onde foi aprovado o estado de sítio, "... os principais culpados, ou seja, sobre os líderes do motim e os responsáveis ​​pelo assassinato, incêndio criminoso, roubo e violência, e que sejam perdoados os outros que, afastando-se das fileiras da sedição, se apresentaram às autoridades”.

A ação de Manuela e o desfecho final

Manuela desempenhou um papel importante na luta dos povos, também conhecida como Hatun Cacha Loma, liderou a captura da paróquia de Punín, junto com Francisco Guzñay e outros bravos líderes em 21 de dezembro, enfrentando as tropas do governo por um período de duas semanas, declinando diante da superioridade em armas das tropas.

Em 3 de janeiro de 1872, a "calma" voltou, dissolvendo três companhias da guarda nacional acionadas. Segundo Costales Samaniego, vários líderes foram condenados à morte sem julgamento. Julián Manzano e Manuela León foram executados diante do olhar indefeso de seus ayllus da região na praça central de sua própria comunidade San Francisco de Makshi; e, posteriormente, Francisco Guzñay, Pacífico Daquilema e Juliana Paguay. Em 13 de março, o estado de sítio foi levantado, mas o julgamento criminal continuou.

Em 25 de março de 1872, o Conselho de Guerra reuniu-se para julgar Fernando Daquilema, declarando-o culpado por dois supostos crimes: ter sido o principal líder do motim em que foi declarado rei e ser responsável pelo assassinato de Rudecindo Rivera; sendo condenado à morte em 8 de abril de 1872.

Ironicamente, o Ministério do Interior enviou uma circular às províncias, informando que tomou conhecimento dos abusos cometidos por compradores de primícias, leiloeiros de dízimos e arrecadadores da contribuição subsidiária que chegaram ao extremo de arrebatar seus filhos dos infelizes como penhor da quantia que querem arrecadar, tentando assim fazer justiça à revolta liderada por Daquilema.

Fonte pesquisada:
1 - https://es.wikipedia.org/wiki/Manuela_Le%C3%B3n
2 - http://www.culturaenecuador.org/quienes-somos/miembros/259-fernando-daquilema-y-manuela-leon-heroes-nacionales.html

segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Lei 10.639 - 19 anos de sua criação


No dia 09 de janeiro de 2022, completou-se 19 anos da Promulgação da Lei Federal Nº 10.639, que rege a obrigatoriedade do ensino da história afro-brasileira na rede oficial de ensino (2003). 

A Lei 10.639, sancionada em 2003 pelo Presidente da República, Luiz Inácio LULA da Silva – alterou a LDB (Lei de Diretrizes e Bases, 1996) e instituiu a obrigatoriedade no ensino fundamental e médio, público e particular, do ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira – passando a ter especial importância para a divulgação/valorização do legado cultural africano que recebemos desde o século XVI, pois além de ampliar o parco conhecimento que temos dessa cultura, supõe um novo olhar sobre a história africana e afro-brasileira e suas relações como o percurso histórico brasileiro. 

Por isso, antes de mais nada, acreditamos que a inclusão desse tema nos conteúdos escolares reconstrói nos alunos e nos professores uma imagem positiva daquele continente, além de, por um lado, elevar a autoestima dos alunos afrodescendentes e, por outro lado, tornar os demais alunos menos refratários à diversidade étnico-racial. 

A referida lei não foi sancionada de um dia para o outro. Ao contrário, antes de ser sancionada, passou por diversos estágios, sendo um resultado concreto da mobilização dos movimentos negros da década de 1970 e do esforço de simpatizantes da causa negra na década de 1980, quando diversos pesquisadores alertaram para a evasão e para o déficit de alunos negros nas escolas, em razão, entre outras causas, da ausência de conteúdos afrocêntricos que valorizassem a cultura negra de forma abrangente e positiva. 

Marcha Zumbi dos Palmares - 20/11/1995

Na década de 1990, ocorrem movimentos intensos em todo Brasil a favor da afirmação da identidade negra, com destaque para a célebre Marcha Zumbi dos Palmares, que reuniu cerca de 10 a 30 mil negros e negras, que foram a Brasília com um documento reivindicatório a ser entregue ao então presidente Fernando Henrique Cardoso. Diante de muitas lutas e de alguns resultados conquistados, a causa negra adquire mais força a partir dos anos 2000, finalizando com a promulgação, em 2003, da referida lei.

ANTECEDENTES GERAIS DA LEI 10.639  

Nos anos de 1970, por exemplo, podemos citar um exemplo dessa luta pela afirmação do negro na figura de Abdias do Nascimento, intelectual, autor, ator, dramaturgo e político que incorporou em seu trabalho a causa negra, seja por meio de sua colaboração no próprio Movimento Negro, seja pela criação do Teatro Experimental Negro (TEN). Os movimentos sociais negros da década de 70, entre eles o Movimento Negro Unificado (MNU), buscaram a revalorização da história e cultura africana e afro-brasileira, procurando assim a construção e afirmação de sua identidade, forçando o reconhecimento do negro pela sociedade e, consequentemente, sua inclusão social, de forma mais justa e igualitária (PEREIRA, 2010). 

Uma das preocupações desses movimentos voltava-se, principalmente, para a educação, histórica demanda do movimento, segundo GONÇALVES & PETRONILHA (2000): como os negros militantes buscavam reagir à precária situação educacional de seu grupo étnico exigiu deles um tipo de compromisso pessoal, de engajamento direto para resolver um problema que não era exclusivamente dos negros, mas era um problema nacional. (p.145)

Já na década de 1980, constatou-se, por exemplo, que a discriminação racial, presente no cotidiano escolar, era a responsável direta pela crescente desigualdade de percurso entre os alunos negros e brancos (FILHO, 2011). 

Havia, então, na escola, comprovadamente, o preconceito e a desigualdade, na mesma época em que eram realizadas diversas pesquisas relacionadas ao tema: o binômio negro-educação passou a ser, assim, interesse de muitos pesquisadores na área da educação. 

Uma das consequências desse interesse foi a determinação da inclusão – em junho de 1985, por intermédio do secretário de educação e cultura da Bahia e do esforço da Universidade Federal da Bahia (UFBA), na figura de seu Centro de Estudos Afro-orientais (CEAO) – da disciplina “Introdução aos Estudos Africanos” nas escolas públicas estaduais do estado, acontecimento de grande simbolismo para a população afrodescendente local. 

Portanto, a década de 1980 representou uma grande conquista na luta contra a desigualdade racial, principalmente no âmbito educacional.

Veja a seguir o texto da Lei:

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.


Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.

        O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

        Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B:

"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.

§ 3o (VETADO)"

"Art. 79-A. (VETADO)"

"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’."

        Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

        Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e 115o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

MNU - Movimento Negro Unificado


O Movimento Negro Unificado (MNU) é uma organização de ativismo político, cultural e social de relevante trajetória no âmbito do movimento negro no Brasil. Fundado no ano de 1978 em São Paulo, o MNU luta pela auto-afirmação cultural e o incentivo à cultura de matriz africana, contribuindo para um novo grau de amadurecimento no movimento negro e um renascimento da cultura negra, além de defender os direitos sociais dos negros, a igualdade racial e o fim do racismo.

História

A fundação do Movimento Negro Unificado foi deliberada em uma reunião de entidades negras realizada em São Paulo em 18 de junho de 1978, com o fim de "defender a comunidade afro-brasileira contra a secular exploração racial e desrespeito humano a que a comunidade é submetida", "para que os direitos dos homens negros sejam respeitados", e para organizar o ativismo em ampla escala, "levando o negro a participar em todos os setores da sociedade brasileira". 

7 de julho de 1978, nas escadarias do Teatro Municipal da Cidade de São Paulo o Ato Público que criou o MNU

Participaram da reunião a Câmara de Comércio Afro-Brasileira, o Centro de Cultura e Arte Negra, a Associação Recreativa Brasil Jovem, a Afrolatino América, a Associação Casa de Arte e Cultura Afro-Brasileira, a Associação Cristã Beneficente do Brasil, o Jornegro, o Jornal Abertura, o Jornal Capoeira, a Company Soul e a Zimbabwe Soul. Sua primeira atividade foi a organização de um ato público contra o racismo, realizado em 7 de julho do mesmo ano, reunindo cerca de 2 mil pessoas, protestando contra a discriminação sofrida por quatro jovens no Clube de Regatas Tietê e contra a morte de Robson Silveira da Luz, torturado no 44º Distrito de Guainases.

Em sua origem se denominava Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial, abreviado para Movimento Negro Unificado em 1979. A criação do MNU geralmente é reconhecida como um marco no movimento negro brasileiro, assinalando a retomada do ativismo que fora desmantelado pela ditadura militar, e até hoje é uma das entidades mais importantes em seu gênero no país, sendo uma referência para muitos outros grupos.

Seu aparecimento foi influenciado pelas lutas a favor dos direitos dos negros dos Estados Unidos, por movimentos de libertação dos países africanos como Guiné Bissau, Moçambique e Angola, e por correntes de pensamento marxista. Neste contexto, o MNU inicialmente assumiu um discurso politizado radical, compreendendo a luta contra o racismo como parte da luta contra o capitalismo. Diz Petrônio Domingues que "a política que conjugava raça e classe atraiu aqueles ativistas que cumpriram um papel decisivo na fundação do Movimento Negro Unificado: Flávio Carrança, Hamilton Cardoso, Vanderlei José Maria, Milton Barbosa, Rafael Pinto, Jamu Minka e Neuza Pereira". Para Maria Angelica Motta-Maués, o MNU também lutava contra a ditadura, e reeditava amplificadamente "a pretensão dos ativistas da primeira grande organização negra pós-abolição: a Frente Negra Brasileira, criada em 1931".

Mais tarde o MNU abriu núcleos em vários estados e expandiu seu escopo de atuação e suas filosofias orientadoras, incluindo em sua pauta de projetos e atividades a denúncia do mito da democracia racial brasileira, a conscientização política da população negra e popularização do movimento, o engajamento dos sindicatos e partidos políticos, a busca de alianças nacionais e apoios internacionais, a introdução da História da África e do Negro no Brasil nos currículos escolares, a promoção do acesso dos negros a todos os níveis educacionais, a criação de bolsas para permanência dos alunos nas escolas, a releitura crítica da história e da identidade nacionais, o combate aos discursos hegemônicos, à marginalização, à violência policial, ao desemprego e à pobreza, a busca de melhores condições de vida em geral, o fortalecimento da identidade do negro no país e a afirmação de seu importante papel histórico, cultural e social, a valorização das raízes africanas e a recuperação da memória.

Fontes de Pesquisa:
1 - https://www.brasildefato.com.br/2019/04/05/uma-historia-oral-do-movimento-negro-unificado-por-tres-de-seus-fundadores
https://www.palmares.gov.br/?p=21311#:~:text=Em%2007%20de%20julho%20de,a%20Discrimina%C3%A7%C3%A3o%20Racial%20(MNU).
3 - https://www.geledes.org.br/movimento-negro-unificado-miltao/?gclid=CjwKCAiAxJSPBhAoEiwAeO_fP6KofZdpsEWVtQZ-fuQnnNzV2JxkpexbaVUJdB6OQIbsp4FVYK2D5BoCg-QQAvD_BwE
4 - https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_Negro_Unificado

domingo, 16 de janeiro de 2022

Grupo Palmares e a idealização do Dia da Consciência Negra no Brasil


O Grupo Palmares foi uma associação de ativismo político e cultural do movimento negro do Brasil.

Foi fundado em 20 de julho de 1971 na cidade de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, por Antônio Carlos Cortes, Ilmo da Silva, Vilmar Nunes e Oliveira Silveira e um grupo de colaboradores. Oliveira Silveira foi a grande liderança do grupo e o único que permaneceu até o seu fim. 

Vinham com influências do Teatro Experimental do Negro, do movimento francês Négritude, do pan-africanismo e do movimento negro dos Estados Unidos. Em seus estatutos ficava declarado seu objetivo de "promover estudos sobre história, artes e outros aspectos culturais, particularmente em relação ao negro e ao mestiço de origem negra".

Contudo, o ambiente político da época não era favorável ao ativismo. Estava-se em plena ditadura militar, que promovia a repressão de movimentos sociais e impunha muitas restrições sobre a liberdade de expressão, e isso desencadeou temores entre alguns membros de que se fossem feitos registros escritos das atividades do grupo, eles poderiam ser usados para justificar sua dissolução pelas autoridades, o que levou à rejeição dos estatutos e a uma preferência por comunicações orais.

Poeta Oliveira Silveira principal liderança do Grupo Palmares

Não havia uma sede própria e as reuniões foram realizadas em diversos locais. Sua primeira manifestação pública ocorreu em 21 de agosto, um ato cívico na Sociedade Floresta Aurora comemorando dos 89 anos da morte do abolicionista Luiz Gama. Os jornais Correio do Povo e Folha da Tarde deram seu apoio e uma pesquisa sobre Luiz Gama elaborada por membros do grupo foi publicada no Correio. 

Em 20 de novembro de 1971, foi comemorado o primeiro Dia do Negro, com recitação de poesia e apresentação de um estudo sobre o Quilombo dos Palmares, seguidas de debates, com o objetivo de contestar as representações tradicionais e alienadas sobre o dia 13 de maio (data da abolição da escravatura).

Em 1972 ingressaram as primeiras mulheres, Helena Machado, Anita Abad e Nara Helena Soares, e outras as seguiriam mais tarde. Helena Machado logo se tornaria uma das principais lideranças e coordenadora oficial do grupo. As mulheres deram uma contribuição fundamental para as atividades do Palmares, organizando ações culturais e usando poesia, música, dança, capoeira e religião para a conscientização política e preparação para o ativismo antirracista.

Ainda em 1972 foi publicado um manifesto no jornal Zero Hora, com um posicionamento politizado. O documento denunciava o processo de aculturação forçada que o negro havia sofrido, defendia a conscientização da comunidade negra para que assumisse sua missão de lutar contra o racismo e a discriminação, e identificava como impedimentos para este objetivo a educação pobre e a apatia da comunidade. O manifesto desencadeou repercussões em outros locais e foi republicado pelo Jornal do Brasil. Reuniões para debates e comemorações de datas importantes continuavam acontecendo, principalmente nos clubes Floresta Aurora e Marcílio Dias, e suas atividades eram regularmente cobertas pela imprensa, que se tornava um dos principais instrumentos do grupo para divulgação de seus ideais.


O reconhecimento público crescia, e passavam a ser programadas outras atividades, como exposições de arte, espetáculos teatrais e musicais, formação de uma biblioteca e contatos com outras entidades e grupos culturais e religiosos para troca de informações e experiências. Em 1974 outro manifesto foi publicado pelo Jornal do Brasil, onde defendia a formação de um movimento para a revisão da historiografia sobre o negro, o que aumentou a visibilidade do grupo em âmbito nacional e possibilitou a criação de laços com grupos ativistas do centro do país. Ao mesmo tempo recusava o dia 13 de maio como data magna do negro brasileiro, propondo como alternativa o 20 de novembro, data da morte do líder quilombola Zumbi dos Palmares. Essa mudança foi rapidamente adotada por outros grupos ativistas no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo.

Em 1976 o Palmares foi procurado pelo Instituo de Pesquisa das Culturas Negras do Rio de Janeiro, a fim de criar um canal de comunicação entre ambos. Vários estudiosos e escritores passaram a colaborar, o que levou à criação de "semanas do negro" em Campinas, São Paulo e Rio, com a participação de vários grupos, como o Teatro Evolução, o Centro de Cultura e Arte Negra, o Grupo André Rebouças e a Sociedade de Intercâmbio Brasil-África. Ainda em 1976 o Palmares publicou o opúsculo Mini-história do Negro Brasileiro, onde era declarado que a história do negro no Brasil havia sido deturpada pela historiografia oficial e necessitava ser recontada.

O intercâmbio entre o Palmares e grupos em diferentes estados levou à articulação da ideia de formação de um movimento negro de caráter nacional. Essa mobilização se concretizou em São Paulo com a fundação do Movimento Negro Unificado (MNU), criado em 18 de junho de 1978. Numa assembleia nacional realizada em novembro na Bahia, o MNU aprovou a proposta do Grupo Palmares de transformação do 20 de novembro em Dia Nacional da Consciência Negra. Nesta altura o Palmares já havia deixado de existir, tendo se dissolvido em 8 de agosto a fim de concentrar os esforços de seus membros na publicação de um periódico independente, a Revista Tição, que havia sido lançada em março.

Mesmo procurando inspiração em movimentos estrangeiros, era uma preocupação do grupo fincar firmemente o pé na realidade brasileira, enfatizando a necessidade de conhecerem os autores negros que marcaram a história nacional e desenvolver suas ideias a partir das experiências que eles traziam. 

O Palmares nunca buscou um confronto direto com a estrutura social, institucional e legal vigente, mas procurou criar espaços e alternativas de ação e mobilização principalmente através do campo discursivo, o que não teria sido possível sem o apoio da grande imprensa. As atividades do grupo eram monitoradas pelas autoridades militares, mas passou-lhes despercebido o significado político desse discurso e o que ele continha de contestação à historiografia oficial, ao pensamento eurocêntrico das elites e à ficção da democracia racial apregoada pelo governo. O sucesso da sua mobilização tornou-se uma referência para os grupos negros surgidos a partir de então.

Em 2011 o Dia Nacional da Consciência Negra foi oficializado pelo Congresso através da Lei 12.519.

Para Elenior Marques, "pode-se inserir o Grupo Palmares na esteira de um movimento amplo que foi se consolidando ao longo do século XX nos segmentos mais escolarizados da população negra. Nesta linha desenvolveu percepções da negritude como forma de luta e resistência". Segundo Deivison Campos, o Palmares foi um catalisador dos anseios e demandas da comunidade negra de Porto Alegre, que desde a década de 1960 vinha sendo expulsa de seus bairros tradicionais e empurrada para as periferias. "Com a ausência desse espaço geográfico, sobrou o simbólico. [...] Os elementos simbólicos tiveram que ser reelaborados e a partir deles foram buscadas outras referências para se construir novos parâmetros de identidade. 

O processo de ressignificação se deu através da proposta de revisão histórica e da tradução de influências vindas da diáspora negra", onde a memória da África surgia mitificada e passava a ser um componente central em uma reorganização da ideologia do movimento negro. Possibilitou a formação de uma nova identidade coletiva baseada na etnia e em raízes históricas e culturais que haviam sido cortadas e apagadas no processo de integração forçada do negro na sociedade dominante branca.

De acordo com Leslie Chaves, o Grupo Palmares é considerado "um dos marcos da constituição dos movimentos sociais negros modernos e do processo de reorganização dessas mobilizações depois do Golpe Militar no Brasil".

Fontes de Pesquisa:
1 - https://www.ceert.org.br/noticias/historia-cultura-arte/1904/fundadores-relembram-trajetoria-do-grupo-palmares
2 - https://pt.wikipedia.org/wiki/Grupo_Palmares
3 - https://www.geledes.org.br/grupo-que-idealizou-o-dia-da-consciencia-negra-teve-de-dar-explicacoes-ditadura/

Teatro Experimental do Negro

Teatro Experimental do Negro ensaiando Sortilégio, com Abdias do Nascimento e Léa Garcia, 1957. Arquivo Nacional.

Histórico

O TEN foi fundado e dirigido por Abdias Nascimento e Maria Nascimento, sua esposa.

A ideia para sua criação nasceu em 1941, após um encontro com os poetas Efraín Tomás Bó, Godofredo Tito Iommi, Raul Young e Napoleão Lopes Filho, que desde a década de 1930 formavam a Santa Hermandad Orquídea, para assistir à peça O Imperador Jones, de Eugene O'Neill, no Teatro Municipal de Lima. Naquela montagem, um ator branco com o rosto pintado de negro, o argentino Hugo D’Evieri, interpretava o protagonista negro.

De volta ao Brasil, Abdias do Nascimento foi preso em consequência de seus protestos contra a discriminação racial. Ainda na penitenciária do Carandiru, criou com outros presos o Teatro do Sentenciado. Ao deixar a prisão, concebeu uma companhia teatral voltada para o desenvolvimento da cidadania e conscientização racial. O elenco foi composto por operários e empregadas domésticas. Alguns dos primeiros membros eram analfabetos, e foi preciso realizar cursos de alfabetização para que eles pudessem ler os textos das peças.

Em 30 de março de 1947.

A estreia da companhia foi em 1945, com O imperador Jones. Eugene O’Neill cedeu gratuitamente os direitos para encenar o texto. A escolha se justificou pela ausência, na dramaturgia brasileira da época, de obras que contemplassem o problema racial. No dia 8 de maio de 1945, o TEN se apresentou no palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Aguinaldo Camargo representou o papel principal sob a direção de Abdias Nascimento.

A primeira montagem de um texto brasileiro veio dois anos depois, com O filho pródigo, drama poético de Lúcio Cardoso. Aguinaldo Camargo vatuou ao lado de Ruth de Souza, José Maria Monteiro, Abdias do Nascimento, Haroldo Costa e Roney da Silva. Tomás Santa Rosa assinou os cenários.[3][4] Nelson Rodrigues escreveu para o TEN a peça Anjo Negro (1946), cuja estreia no Teatro Municipal do Rio de Janeiro teve como condição de o ator principal ser um branco pintado de preto. O TEN produziu vários outros espetáculos, trabalhando com textos brasileiros e estrangeiros.

Além da atuação nos palcos, o TEN assumiu uma postura política, criando entidades como a Associação das Empregadas Domésticas e o Conselho Nacional de Mulheres Negras. Publicou o jornal Quilombo, que denunciava a discriminação racial em todo o Brasil e dava notícias e informações sobre cultura negra no mundo. Combateu o padrão eurocentrista de beleza dos concursos de Miss Brasil, realizando concursos de beleza para mulheres negras.

Lea Garcia e Fredman Ribeiro na peça "Onde está marcada a cruz"

Em 1955, promoveu a Semana do Negro e um concurso de artes plásticas tendo como tema o Cristo Negro. Publicou o jornal Quilombo (1948-50), a antologia Dramas para negros e prólogo para brancos (1961), e os livros Sortilégio (Mistério Negro), de Abdias Nascimento (1959), e Teatro Experimental do Negro: Testemunhos (1966).

O TEN foi impedido pelo governo brasileiro de participar do primeiro Festival Mundial de Artes Negras, realizado no Senegal em 1966, ocasião em que Abdias Nascimento publicou sua "Carta Aberta a Dacar" denunciando o critério discriminatório aplicado pelo Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores). O artigo foi publicado pela revista Présence Africaine, editado pelo renomado intelectual senegalês Alioune Diop.

Ensaio para "O Colar de Coral", em 12 de setembro de 1958.

Em 1968, o TEN realizou um ciclo de debates e a primeira exposição do projeto Museu de Arte Negra, no Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro. Logo em seguida, Abdias Nascimento viajou para o exterior, onde foi obrigado a ficar durante 13 anos de exílio. No exterior, ele continuou o trabalho do TEN ao desenvolver atividades culturais e artísticas, bem como continuar o combate ao racismo.

Fonte pesquisada: https://pt.wikipedia.org/wiki/Teatro_Experimental_do_Negro

quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

Frente Negra - 1ª Organização Negra Pós "Abolição" no Brasil

Imagem de militantes da Frente Negra Brasileira em uma delegação da entidade (local não identificado)

Em 16 de setembro de 1931, na cidade de São Paulo, foi criada a Frente Negra Brasileira (FNB). Durante a primeira metade do século 20, a FNB foi a mais destacada entidade negra no Brasil, Com um programa preestabelecido de reivindicações, visava conquistar posições para o negro em todos os setores da sociedade brasileira.

A entidade se expandiu como grupos homônimos em vários estados, a exemplo do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Bahia. 

Arregimentando milhares de afrodescendentes, esta se converteu num verdadeiro movimento de massa, chegando a atingir o número expressivo de 20 mil sócios. A FNB proporcionou à população afrodescendente – excluída e marginalizada – serviços de assistência social, e debatia meios de enfrentar e combater o preconceito.

Jornal que era publicado pela Frente Negra

A Frente Negra Brasileira (FNB) desenvolveu um trabalho socioeducativo e cultural com: escola, grupo musical e teatral, time de futebol, departamento jurídico e, na área da saúde, prestou atendimento médico e odontológico. Havia também cursos de formação política, de artes e ofícios, além de ter sido responsável pela publicação do periódico “A Voz da Raça” (1933-1937).

Na época, vicejavam as teses do racismo científico (Eugenia), apregoando a ideia de que negros e mulatos constituiam uma raça “degenerada” e, portanto, estavam predestinados ao desaparecimento. Entre os adeptos dessa concepção de raça estavam Nina Rodrigues (1862-1906) e Monteiro Lobato (1882-1948). Essas teses resultaram em políticas públicas, que incentivaram à imigração europeia, indo ao encontro da ideia de embranquecimento.

Quanto às mulheres negras, de acordo com um dos fundadores da FNB, o ativista Francisco Lucrécio, estas “eram mais assíduas na luta em favor do negro, de forma que na Frente [Negra] a maior parte eram mulheres. Era um contingente muito grande, eram elas que faziam todo movimento”. Ainda que outros estudos considerem a afirmação acima um tanto exagerada, torna-se importante registrar que as afrodescendentes exerciam várias funções na FNB. Na Cruzada Feminina, elas eram mobilizadas, visando à realização de trabalhos assistencialistas. Já as Rosas Negras se dedicavam a organizar bailes e festivais artísticos.

A Frente Negra Brasileira realizava uma série de eventos e bailes, como essa festa de aniversário da entidade em 1935

Lutas e Contradições

A FNB, chegou em 1936, a transformar-se num partido político, almejando participar de futuras eleições, a fim de arregimentar votos da “população de cor”. 

Sob a influência do contexto internacional de ascensão do nazifascismo, a entidade defendeu um programa político e ideológico com características de autoritarismo e ultranacionalismo. Naquele momento, sua principal liderança foi Arlindo Veiga dos Santos que exaltava publicamente o governo do italiano Benedito Mussolini (1883-1945), na Itália, e de Adolfo Hitler (1889-1945), na Alemanha. O próprio subtítulo do periódico “A Voz da Raça” era sintomático: “Deus, Pátria, Raça e Família”, sendo diferente do lema dos integralistas (movimento de extrema direita) apenas pela presença do termo “Raça”.

Neste período, A Frente Negra Brasileira (FNB) organizou uma milícia inspirada nos “boinas verdes” do fascismo italiano. Recebida numa audiência pelo, então, Presidente da República Getúlio Vargas (1882-1954), teve algumas de suas reivindicações atendidas, a exemplo do fim da proibição de ingresso de negros na Guarda Civil de São Paulo. O episódio é uma indicação do poder de barganha que o movimento negro, naquele momento, dispunha no cenário político.

À época, o racismo se apresentava de forma exacerbada até em forma de anúncio em muitos periódicos: “Precisa-se de empregado, mas não queremos de cor”. A entidade também atuava por meio de alguns movimentos no interior, especialmente nos lugares em que os afrodescendentes não passeavam nos jardins, mas na calçada.

A Frente Negra Brasileira oferecia aulas e palestra aos associados. Tinha até uma banda, como mostra imagem da década de 1930

Segundo Abdias Nascimento (1914-2011), o fracionamento da FNB ocorreu devido à polarização política de suas lideranças: Arlindo Veiga dos Santos (1902-1978) liderava o Movimento Patrianovista de caráter nacionalista, monarquista conservador e tradicionalista, alinhando-se à Ação Integralista Brasileira; e José Correia Leite (1900-1989) que se filiava à corrente socialista. Abdias também declarou “Como movimento de massas, foi a mais importante organização que os negros lograram após a Abolição da Escravatura em 1888”.

Implantada a ditadura do “Estado Novo”, em 1937, por Getúlio Vargas, a Frente Negra Brasileira (FNB) e todas as outras organizações políticas foram extintas. O movimento negro, diante do novo modelo político, que se instalara no Brasil, foi diluído e enfraquecido. O Movimento Negro havia escolhido, desde os anos 20, a figura ícone da Mãe-Preta, cujo monumento foi inaugurado, em São Paulo, somente em 1955,.como parte das comemorações do IV Centenário da Cidade de São Paulo.

O importante jornal O Exemplo (1892-1930), editado em Porto Alegre, por afrodescendentes, registrou a campanha, para que se inaugurasse um monumento alusivo à Mãe Preta. Um dos principais objetivos da Frente Negra Brasileira era a defesa de uma “Segunda Abolição”, pois a primeira (1888) havia deixado um legado de exclusão social e pobreza, sem oferecer aos libertos a condição de exercerem de forma plena e integrada a sua condição de cidadãos.

Importante registrar que, além da Frente Negra Brasileira, na década de 30, outras do gênero surgiram, buscando promover a integração do afrodescendente à sociedade de forma mais abrangente, como o Clube Negro de Cultura Social (1932) e a Frente Negra Socialista (1932), na cidade de São Paulo; a Sociedade Flor do Abacate, no Rio de Janeiro, a Legião Negra (1934), em Uberlândia/MG, e a Sociedade Henrique Dias (1937), em Salvador.

No Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, merece destaque a fundação da Sociedade Beneficente e Cultural Floresta Aurora que foi criada, em 1872, por negros alforriados, um ano após de ter sido assinada a Lei do Ventre Livre (1871).

Fontes pesquisadas:
1-https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53000662
2-https://www.geledes.org.br/frente-negra-brasileira-2/?gclid=CjwKCAiAlfqOBhAeEiwAYi43F7vAaCInCrVzKtzxjomYuUtkZkAGo2fiLjKS3HxlimkljYiuycocHxoCPwYQAvD_BwE

Mãe Preta


Mãe preta é uma escultura de bronze, que retrata uma mulher negra amamentando uma criança branca, localizada no Largo do Paissandú, no Centro Histórico de São Paulo. A obra foi produzida por Júlio Guerra e data de 23 de janeiro 1955.

A representação na escultura remete à ama de leite. Até 2021, era a única escultura de uma mulher negra na cidade de São Paulo e se tornou um ponto marcante para atos políticos e culturais do movimento negro.

Reconhecimento

A escultura foi produzida no contexto das celebrações do Quarto Centenário, sendo a vencedora de uma competição para a produção de obras públicas em São Paulo. A escultura foi tombada pelo CONPRESP em 2004.

Controvérsia

Despertou críticas, em especial do movimento negro, pois há um exagero na proporção de pés e mãos em comparação com o resto do corpo, especialmente a cabeça, diminuta. Foi portanto criticada como uma representação da mulher negra na perspectiva da elite branca.


Um pouco da história

Em meados dos anos 1920 alguns militantes negros, dentre os quais vários jornalistas e intelectuais, tiveram a idéia de fazer uma escultura representando a Mãe Preta. O objetivo era chamar a atenção para a importância dos negros na formação do país. Tratava-se de uma "homenagem à imagem da mulher negra que conheceu e geriu como ninguém o mundo doméstico, que deu a vida por bebê alheio, que ensinou as primeiras palavras, cantou para dormir as moças apaixonadas, tirou piolhos e deixou dengoso os futuros donos do poder". (grifos nossos)

"Essas mulheres seriam a representação do trabalho, do amor e da negação de si próprias e, estavam eternizadas na memória de muitos brasileiros negros e brancos naquele inicio de século". Embora não faltassem, desde a idéia inicial, os contrários a esse elogio a um passado que para alguns devia ser esquecido. (grifos nossos)

O plano daqueles militantes era que a escultura fosse erigida no Rio de Janeiro, então capital federal, mas houve recusas e com o advento da Revolução de 1930 a idéia foi abortada. Os anos 1930 no Brasil foram marcados pela eleição de alguns símbolos nacionais como o samba, a mulata, a feijoada o culto a Nossa Senhora Aparecida. Essa foi uma estratégia populista do governo Getúlio Vargas para conter a pressão que muitos negros faziam em favor de reconhecimento e visibilidade política, social e cultural. Curiosamente, ao mesmo tempo em que o samba tornava-se um símbolo nacional, casas de candomblé sofriam com a repressão policial, e os capoeiristas não raro eram vistos também como malandros, desempregados e perigosos na visão das elites.

Segundo a historiadora Maria Aparecida de Oliveira Lopes, que estudou a atuação da imprensa negra em São Paulo, “Os negros paulistas que escreviam nos jornais alternativos, entre 1940 e 1960, escolheram como figura central da história do negro brasileiro uma representante da ala feminina: a mãe negra”. As muitas mães negras foram mulheres compradas, ainda moças entre 13 e 15 anos de idade para desempenhar serviços domésticos: lavar, passar, arrumar a casa e ser a mãe das crianças ricas. Em 1953, ainda, segundo Lopes, a Folha da Noite informou que o Clube 220, entidade que reunia a “família de cor” de São Paulo, por meio de seu presidente o Sr. Frederico Penteado Junior, sugeriu à Câmara Municipal a ereção do busto da Mãe Preta em uma das praças públicas da cidade. 

Novamente como nos anos 20 houve resistência do prefeito, mas depois de apelações seguidas e a reunião de mais de 500 assinaturas o pedido foi aceito. O lugar escolhido para abrigar a escultura foi o Largo do Paissandu, local já bem conhecido à época por sua igreja dos negros que ali se instalou em 1903, após a irmandade do Rosário de Nossa Senhora dos Homens Pretos ser obrigada a desapropriar o terreno no Largo do Rosário ocupado desde o século 18, onde hoje é a BMF. 

A presença dessa igreja na zona central nunca foi algo tranquilo, sua inauguração em 22 de abril de 1908 ocorreu, embora os moradores protestassem que com a construção a praça perderia sua beleza original. Mais tarde, em 1940, a igreja sofreria ameaças de demolição, especialmente com o desenvolvimento da Cinelândia cujo público dos cinemas eram as elites. O prefeito Prestes Maia intencionou substituir a igreja por um monumento a Duque de Caxias, mas sem sucesso. A igreja foi e é um templo modesto com dificuldades de se manter, de alocar recursos para restauração do seu edifício e da praça como um todo.

IV CENTENÁRIO

Em 1954 São Paulo comemorava seu IV aniversário. Esse evento foi muito importante na história da cidade que tinha em torno de três milhões de habitantes. Grande parte dessa população morava nos subúrbios e as ruas da zona central concentravam o comércio e os serviços, educação e cultura. As celebrações duraram um ano e com ela não só o monumento a Mãe Preta foi inaugurado, mas também o Monumento às Bandeiras de Victor Brecheret, que estava na fila de espera desde os anos 20.

Inaugurada em 1955, no fim das celebrações do aniversário da cidade, após concurso venceu o escultor Ibirapuera, pseudônimo de Julio Guerra (1912-2001), artista descendente de família nobre de Santo Amaro, formado na Escola de Belas Artes. A aparência de estilo moderno da escultura desagradou militantes, como o jornalista e escritor negro José Benedito Correia Leite. Em sua opinião a escultura não representava a mulher negra bonita, educada e arrumada que foram as amas de leite. O que desagradou Correia Leite foram os exageros comuns ao traço modernista: os pés e as mãos enormes como símbolos da atividade produtiva da Mãe. Basta lembrarmos que A negra da artista Tarsila do Amaral tem a boca e o seio enormes e figuras negras como o homem da tela Café, de Candido Portinari tem seus pés e mãos arranjadamente desproporcionais.

FLORES

A partir de 1960 o Clube 220 com auxilio de fiéis do candomblé começou a comemorar o "Dia da Mãe Preta em 13 de maio", realizando festividades em torno da estátua. Em 1970 tanto o prefeito de São Paulo quanto o arcebispo assistiram ao evento anual e, em 1972, o 220 conseguiu trazer à capital paulista o presidente Médici. Durante a festividade, que reuniu em torno de 10 mil pessoas, o presidente, em gesto que também foi acompanhado pelo então Governador de São Paulo, Laudo Natel, depositou flores aos pés da estátua. Essa atitude ocorre ainda hoje, e diante ou em cima da estátua são feitas oferendas de flores, cigarros, bilhetes com pedidos, o que tornou a imagem uma evocação da Preta Velha do imaginário popular.

Mas foi ainda nos anos 1970, com o fortalecimento da militância negra na forma de um expressivo movimento social, que a figura da Mãe Preta sofreu críticas contundentes. Para alguns militantes essa imagem só servia para a elite. Certos ativistas chamavam a atenção para o fato de que a Mãe era um agente, um sujeito histórico e biográfico não apenas a empregada submissa e passiva, cuidando da elite desde a mais tenra infância.


O Monumento na atualidade

Nos dias atuais a praça que abriga esses dois símbolos (Estátua e Igreja) da "história dos negros em São Paulo" está entregue pelo poder público à sujeira e, longe do perfume das flores que poderiam ser depositadas aos pés da estátua predomina o cheiro forte de urina e miséria que deteriora tanto as paredes da igreja quanto a base do monumento. (grifos nossos)

A escultura foi reconhecida como patrimônio histórico em 2004.

Outras formas de chamar a atenção para a importância da memória de acontecimentos marcantes relacionados à memória negra e afro-brasileira, sofrem represálias, demonstrando que a estrutura social brasileira é marcadamente racista. 

O grupo Frente 3 de fevereiro por exemplo, fez uma ação monumentalizante para relembrar a memória do jovem dentista Flavio Santana, negro, 28 anos, morto pela polícia de São Paulo por racismo em 3 de fevereiro de 2004. A atitude do grupo sofreu represálias como a destruição da obra, espécie de lápide que fizeram em homenagem ao jovem assassinado, no local mesmo da tragédia. 

Fontes pesquisadas:
1 - http://www.omenelick2ato.com/historia-e-memoria/734
2 - https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A3e_preta

terça-feira, 11 de janeiro de 2022

O Massacre da Chácara São Bento - Um dos maiores crimes da Ditadura Militar no Brasil


Era janeiro de 1973, entre os dias 7 e 8, a Ditadura Militar no Brasil, através de seus órgãos de repressão, cometem um massacre, ou chacina, numa localidade na zona rural de Paulista/PE.

O episódio criminoso ficou conhecido como O Massacre da Chácara São Bento.

Na localidade foram assassinados(as) covardemente, seis militantes revolucionários, integrantes da VPR - Vanguarda Popular Revolucionária, um dos grupos de esquerda que pegaram em armas contra a Ditadura Militar, instalada com o Golpe de 1964. 

Eudaldo Gomes, Pauline Reichtsul, Soledad Barret, José Manoel, Jarbas Marques e Evaldo Luiz 

As vítimas do massacre da granja São Bento foram Soledad Barret, Jarbas Marques, Eudaldo Gomes da Silva, Evaldo Luiz Ferreira de Souza, Pauline Reichtsul e José Manoel da Silva.

Um pouco da história

Os seis militantes, entre outros, estavam integrados num projeto de montar uma base da VPR em Pernambuco e por quase um ano vinham articulando maneiras de reiniciar a luta armada urbana contra o regime militar.

A pessoa que estava à frente da organização em Pernambuco, era José Anselmo dos Santos, ex-marinheiro brasileiro conhecido como cabo Anselmo. Ele foi um dos principais agentes duplos da ditadura militar e delatou ao menos 200 militantes. Sendo que cerca de cem perderam suas vidas. Seis delas durante uma chacina no então município de Paulista, em Pernambuco, o chamado Massacre da Granja (ou Chácara) São Bento.

O cabo Anselmo articulou uma falsa reestruturação do grupo revolucionário em Pernambuco e os entregou para serem aniquilados por policiais e militares. Entre os assassinados estava a mulher com quem Anselmo viveu maritalmente em Recife, a militante paraguaia Soledad Barret Viedma, que inclusive estava grávida.

"Em 1971, a luta armada de esquerda estava desmobilizada. Anselmo concordou em ser usado pelo regime para dar esse tiro de misericórdia. Era para passar um sinal para os outros grupos de que a luta armada não valeria a pena", segundo afirma Luiz Felipe Campos autor de um dos livros que trata do episódio. Um dos “comandantes” de Anselmo nessa trama foi o famoso delegado torturador Sergio Paranhos Fleury, um obstinado perseguidor de rebeldes que atuou no Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo.

Entre os dias 7 e 8 de janeiro de 1973, os seis foram presos. Seus corpos foram encontrados crivados de balas nas proximidades da chácara São Bento, no dia 9. Dos 32 projéteis encontrados nos corpos, 14 estavam alojados nas cabeças das vítimas. Diversas armas foram espalhadas ao redor dos cadáveres. A polícia, na ocasião, disse que desbaratou um congresso de militantes da VPR. Trocou tiros com eles. Matou todos. E nenhum policial saiu ferido, nem de raspão.

Uma das razões para a chacina ter ocorrido foi que o jogo duplo de Anselmo começou a ser desvendado. Na antevéspera do massacre, Soledad, a mulher dele, recebeu uma carta em que o comando da VPR que estava exilado no Chile alertava sobre a possibilidade da traição de Anselmo. Ingenuamente, ela mostrou a carta para o ex-militar. Foi sua sentença de morte e dos outros cinco companheiros dela. Assim que o sexteto foi preso, Anselmo deixou Recife da mesma forma que chegou, clandestinamente.

A imprensa, à serviço da Ditadura Militar, publica o episódio de acordo com a versão montada pelos órgãos de repressão.




Um Perfil de cada Revolucionário(a)

A partir dos documentos revelados e das ações das instituições empenhadas em desvendar os crimes da Ditadura Militar

Clique nas imagens para acessar as informações.

Soledad Barret Viedma
 
Pauline Reichstul

José Manoel

Jarbas Marques

Evaldo Luiz


Imagens Fortes

Fotos dos arquivos da repressão à época, reveladas posteriormente, graças aos esforços dos movimentos (entre eles o Movimento Tortura Nunca Mais) responsáveis por identificar os fatos históricos e revelar as vítimas da repressão, mostram claramente que as vítimas (os militantes revolucionários) foram torturados(as) e executados(as) covardemente.

Foto do local do Massacre, a Granja São Bento

As fotos a seguir, mostram os corpos com marcas de torturas e sevícias, mortos anteriormente ao anúncio para a imprensa.

A montagem das cenas é flagrante, na posição dos corpos e nas marcas de balas na cabeça.
 
























Fontes pesquisadas:

1 - https://www.fundacaoastrojildo.org.br/8185/
2 - https://memoriasdaditadura.org.br/
3 - https://documentosrevelados.com.br/?s=%22s%C3%A3o+bento%22
4 - https://revistacontinente.com.br/secoes/lancamento/o-massacre-da-granja-sao-bento
5 - https://anistiapolitica.org.br/abap3/2017/08/31/o-massacre-da-granja-de-sao-bento-aborda-morte-de-guerrilheiros-na-ditadura/